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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Acenda seu lampião

Há dias que você sai de casa para executar uma tarefa comum, sem esperar nada grandioso ou que lhe traga alegria.

Quase no automático me dirigi ao ponto de ônibus arrastando um carrinho de corujas, para ir lá na zona cerealista comprar minhas farinhas integrais, meus condimentos, e outras coisitas que pago bem mais em conta por lá.

Adoro ir curtindo o caminho que já conheço bem, mas sempre reparo em algo diferente, que mudou mesmo, ou que nunca tinha reparado antes. Nada de extraordinário, até chegar à Casa do Arroz Integral, uma das minhas lojas prediletas, porque é bem organizada, os atendentes são sempre atenciosos e a ordem de atendimento é bem clara.

Peguei meu número, como sempre e rapidamente foi chamado por um simpático rapaz, que me deu bom dia e continuou falando alto aos demais clientes da loja:

- Prestem atenção à chamada das senhas.

Todo produto que pedi me deu prova, ofereceu para o cliente do lado e de tempo em tempo, tornava a falar bem alto pata ficarem atentos a chamada, sempre com frases simpáticas.

Voz bonita, boa entonação, mas o que mais me surpreendeu é que além de não ser obrigação dele, ainda o fazia com alegria, como se fosse a sua tarefa predileta e o melhor serviço do mundo.

Quase no final do atendimento, um dos colegas atendentes encostou nele na balança e falou algo que meus ouvidos distraídos não escutaram, mas a resposta do meu atendente favorito veio imediata e curta:

- A gente ganha pouco, mas temos que ser feliz!

Essa frase e o jeito que ele arrumou de ser feliz ficaram grudados no meu cérebro... devaneios, recordações, vivências, tudo foi se misturando.

E, por conta desse filósofo experimental, minha sexta-feira ficou muito melhor, nem o temporal do final da tarde, que me fizeram ficar quase duas horas no ponto de ônibus, com os pés e pernas encharcados, nem o imbecil do motorista que passou na beirada da calçada me dando um banho de água suja me perturbaram ou me deixaram mal humorada, porque eu estava a caminho da faculdade, para mais um encontro com meus alunos, os poucos que resistiram a faltar em plena sexta-feira de carnaval.

Fica o registro, nada pode nos impedir de ser feliz, acenda seu lampião.

Sinceramente, ainda que tenha comprado um bom provimento, não vejo a hora de voltar lá e ver o moço sendo um bom profissional e feliz.

Por: Yara Verônica Ferreira

O meu Rei Momo

Quando ainda pequena, vê-lo com a coroa e o cetro era como um sonho que eu queria levar para a vida adulta.

Minha mãe confirma que eu tinha cinco anos quando me levaram a primeira vez para ver os desfiles de carnaval, que naquela época ainda aconteciam na Avenida São João, pertinho do Anhangabaú.

Eu amava o som da bateria, meu coração parecia bater no mesmo compasso. Desde muito pequena tinha consciência plena desse amor pela cadência do samba e que me fazia sentir uma pequena rainha.

Por sorte, meu pai era amigo do Rei e sempre ficava pertinho dele. Sentia um orgulho imenso de conhecer e poder ouvir o Rei tocar o surdo ou a cuíca, de olhos fechados, sentindo a música como eu mesma sentia no meu coração.

Minha mãe sempre fala orgulhosa que desde a primeira vez que me levaram no sambódromo, eu dormia nos intervalos, mas quando ecoava o primeiro som da bateria ao longe, eu já me punha de pé sambando. Até hoje, meus pés parecem ter vida própria quando ouvem o batuque do samba.

O Rei Momo daquela época era Irineu Pugliesi (http://www.moocaonline.com.br/fotosmooca.htm), nascido no bairro da Mooca, carregou a coroa e o cetro de Rei do Carnaval Paulistano de 1969 a 1983, nada mais justo, já que dominava alguns instrumentos musicais e tocava como jamais ouvirei alguém tocar igual. Eu já era adolescente e ainda brilhavam meus olhos de orgulho e alegria por vê-lo naqueles trajes.

Sempre me imaginei sendo rainha um dia e que Irineu ainda fosse o Rei Momo, o que nunca aconteceu, mas, meu coração sempre pulsa forte no primeiro retumbar da bateria e as lágrimas são inevitáveis. Alegria, saudade, emoções que mal sei explicar em palavras.

Só sei que me sinto muito feliz, porque esse Rei ainda existe!

PS) Escrevi essa micro história em 2013, mas na verdade é uma longa história, daquelas que só meu coração sabe o quanto foi importante em minha vida, só posso dizer que foi uma amizade eterna e marcante que realmente começou na minha mais tenra infância e ainda mora em meu coração e sei que no dele também.

Por: Yara Verônica Ferreira